Diocese de Lages

Nulidade Matrimonial


Introdução

Disse Jesus: “Assim, já não são dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus uniu, o homem não separe”. Continua Cristo: “Eu vos declaro que todo aquele que rejeita sua mulher, exceto em caso de matrimônio irregular, e esposa outra, comete adultério”.
Jesus, então, deixa claro:
è Primeiro: Que o matrimônio, como sacramento, é indissolúvel;
è Segundo: Que pode ocorrer matrimônio falso, o que significa que não foi válido, ou melhor, nunca existiu.
É possível anular um matrimônio, segundo as normas da Igreja Católica?
O casamento civil, de acordo com os preceitos jurídicos, pode ser dissolvido ou anulado, isto é, existiu e, por uma decisão do juiz, de acordo com a vontade dos cônjuges, deixa de existir.
Já o sacramento do matrimônio, uma vez realizado com livre consentimento dos noivos e segundo as normas da Igreja Católica, não pode ser anulado, porque é indissolúvel e nem a Igreja tem o poder de anulá-lo. O que pode acontecer é que o matrimônio não tenha sido válido e, aí sim, a Igreja, por meio do Tribunal Eclesiástico, pode dar um sentença declarativa da nulidade do matrimônio.

O Tribunal Eclesiástico

A Igreja, através do chamado Tribunal Eclesiástico, examina, discute e decide legitimamente questões de sua competência e, entre outras, a validade do matrimônio.
Como norma, cada Bispo Diocesano tem seu Tribunal, que se chama de 1a instância.
Existe igualmente o Tribunal Metropolitano, também chamado 2a instância, que serve para confirmar uma sentença de 1a instância ou como recurso de apelação, quando alguém não está conforme com a decisão do 1o Tribunal.
No Brasil há um Tribunal para cada Região pastoral da CNBB, mais um em Brasília e outro em Campinas, totalizando 16 Tribunais de 1a instância e dez Tribunais de 2a instância.
O Tribunal Eclesiástico é presidido por um Vigário Judicial, que representa o Bispo, e mais três a cinco juizes que podem ser sacerdotes, diáconos, homens e mulheres leigos, que se distingam pelos bons costumes, prudência e conhecimento da doutrina cristã.
O fiscal ou promotor de justiça é o encarregado de vigiar e defender o valor do sacramento do matrimônio e da ordem sacra (c. 1432); estes dois ofícios de fiscal e defensor também podem ser desempenhados por leigos.
Cada Tribunal deve ter uma lista de advogados, especializados em Direito Canônico, aprovados para atuar nele.

Do Tribunal competente nas causas matrimoniais

Nas causas de nulidade do matrimônio, qualquer dos dois esposos pode apresentá-la ao Tribunal de 1a instância de uma destas dioceses:
- onde foi celebrado o matrimônio;
- onde tem domicílio ou quase domicílio o demandado (quem responde ao processo);
- onde se encontra a maior parte das provas.
Para que o Tribunal das Dioceses, nos dois últimos casos, possa aceitar, são exigidas algumas condições expressas nos cânones 1673 e 1694 do Código de Direito Canônico.

Duração das causas matrimoniais

A Igreja tem sempre muito cuidado nas normas de funcionamento de seus Tribunais, pois elas forma o Direito Processual Canônico.
Muitos pensam que a administração da justiça, também na Igreja, é lenta por demais e burocráticas; é às vezes têm razão.
A solução não é eliminar as normas, mas aceitá-las como segurança e garantia de respeito aos direitos das pessoas.
Por isto, é preciso obedecer com espírito de eficácia, sabendo que elas foram aprovadas muito oportunamente pelo legislador para que ajudem simultaneamente para obter a verdade, a justiça e a rapidez.
Respeitando os prazos sem prorrogações que possam evitar-se, se alcança uma duração prudente (Cân. 1465). Uma causa deve durar, como norma, em torno de um ano e meio em 1a instância e seis meses em 2a instância.

Causas de nulidade matrimonial

As causas que podem tornar inválido o contrato matrimonial são de três espécies: 1) presença de impedimentos; 2) defeitos no consentimento; 3) falta de forma canônica.
Os impedimentos são obstáculos que impossibilitam contrair o matrimônio validamente e a Igreja como tais os configura para evitar que possam ocorrer matrimônios inconvenientes ou prejudiciais.
O Código de Direito Canônico, promulgado em 1983, estabelece 12 impedimentos dirimentes:
a) Idade: os rapazes não podem se casar validamente antes dos 16 anos completos nem as moças antes dos 14 anos completos. Embora a legislação civil brasileira exija dois anos a mais e a CNBB tenha decretado o mesmo acréscimo, isso diz respeito apenas à licença ao ato de casar;
b) Impotência: a relação sexual realizada de modo humano é considerada pela legislação como consumação daquilo que se prometeu no ato do casamento. Por isso, as pessoas que são incapazes de ter uma relação sexual autêntica não podem se casar validamente (Cân. 1084). Não basta a esterilidade e a impotência deve ser anterior ao matrimônio e perpétua.
c) Vínculo: A Igreja Católica afirma e sempre afirmou que o matrimônio é indissolúvel. Por isso, se alguém está validamente casado e realizasse uma cerimônia de casamento com outra pessoa, essa cerimônia não teria nenhum valor (Cân. 1095).
d) Disparidade de Culto: entre um católico e uma pessoa não batizada (por exemplo, um judeu ou um muçulmano) existe uma diferença tão grande de religião que dificilmente vão conseguir realizar uma comunhão de vida plena. Por isso, o matrimônio entre eles está proibido, sob pena de nulidade (Cân. 1086), precisando ser dispensado pelo Bispo para a validade do casamento, caso se derem as garantias exigidas.
e) Ordem Sagrada: os que receberam o sacramento da ordem, ou seja, os diáconos, os presbíteros e os bispos não podem casar validamente (C. 1087). No caso dos diáconos casados, porém, permite-se que alguém, previamente casado, seja ordenado diácono e atue como tal.
f) Profissão religiosa perpétua: os religiosos, ou seja, os membros de certas instituições que têm gênero de vida especial aprovado pela Igreja, fazem voto de castidade, pobreza e obediência. Isto se chama profissão religiosas. Quando é feita de modo perpétuo ou definitivo, torna nula qualquer tentativa de matrimônio (Cân. 1088).
g) Rapto: Uma mulher conduzida ou retida à força não pode casar validamente com quem está exercitando essa violência contra ela enquanto não for posta em liberdade em lugar seguro.
h) Crime: A fim de proteger a vida do marido ou da mulher traídos, a Igreja declara que os que matam seu cônjuge para facilitar um matrimônio posterior ficam impedidos de realizar validamente este casamento. E também se um homem ou mulher. E comum acordo, matam o esposo ou a esposa de um deles, não podem casar-se entre si (Cân 1090). A dispensa está reservada à Santa Sé.
i) Consangüinidade: A legislação canônica atual estabelece que este impedimento atinge todos os antecedentes e descendentes (ou seja, pai com filha, avô com neta) e também até o quarto grau na linha colateral, ou seja, primos legítimos ou primos primeiros entre si (Cân. 1091).
j) Afinidade: Em razão deste impedimento, um viúvo ou viúva não podem casar legitimamente com os respectivos: sogra(a), enteada(o) ou ascendentes e descendentes destes. (Cân. 1092).
k) Honestidade pública: afeta a quem está vivendo uma união não legalizada pela Igreja e torna inválido o casamento com os filhos ou pais do(a) parceiro(a). (Cân 1093).
l) Parentesco legal: Não está permitido o casamento entre o adotante e o adotado ou entre um destes e os parentes próximos do outro (Cân. 1094).
Os defeitos de consentimentos mais comuns são:
1o – Da parte do intelecto:
a) defeito da mente:
- falta de uso da razão: débeis mentais, os que sofrem de algum transtorno quando vão prestar consentimento (Cân 1095 § 1);
- imaturidade psicológica: grave defeito de discrição de juízo que tira a responsabilidade e a ponderação suficiente para se casar (Cân. 1095 § 2);
- incapacidade para assumir as obrigações essenciais do matrimônio: pode acontecer nos casos de alcoolismo, toxicomania, homossexualismo e outras anomalias (Cân. 1095§ 3).
b) Ignorância: carência de ciência mínima necessária para o casamento (Cân. 1096);
c) Erro: de fato, sobre a identidade da pessoa com quem se casa (Cân 1097§ 1)
- Sobre certas qualidades da pessoa com quem se casa (Cân 1097§ 2);
- Maliciosamente provocado, doloso (Cân. 1098);
- De direito: Sobre as propriedades do matrimônio.
2o – Da parte da Vontade
a) Simulação
- Total: Quando se finge o consentimento com a rejeição do casamento (Cân. 1101 § 2);
- Parcial: Quando exclui propriedade ou elemento essencial do contrato matrimonial (Cân. 1101 § 2).
b) Medo: casar sob pressão, medo grave externo, torna nulo o casamento quando é indeclinável (Cân. 1103);
c) Condição: por uma condição sem a qual não valerá o consentimento, em caso de não cumprimento é inválido o casamento. Precisa de licença escrita do Bispo (Cân. 1102).
A falta de forma canônica habitualmente acontece quando se celebra perante um assistente que ano tem jurisdição sob os nubentes e não recebe a oportuna delegação; por falta da duas testemunhas exigidas ou por alteração substancial de fórmula ritual do matrimônio.

Os principais passos de um processo de nulidade matrimonial

Chamamos processo à seqüência de atos que se realizam para resolver a questão proposta.
Um processo começa com o libelo da demanda, apresentado ao Tribunal por quem pede a causa, a parte autora. Nesse documento deve-se indicar claramente o que se pede (a declaração nulidade do casamento), as razões de fato e de direito e as provas em que se apoia a petição (Cân. 1501 a 1504), pelo menos transcrevendo o rol de testemunhas. O autor pode designar um advogado que o defenda e um procurador que o represente no Tribunal (Cân. 1481).
O juiz admite por decreto o libelo e cita por convocação a outra parte que nas causas matrimoniais é chamado(a) demandado(a). o demandado então contesta o libelo: pode por sua posição e então indicará também razões e provas ou pode não opor-se, submetendo, desde o princípio, a justiça do Tribunal (Cân. 1507).
Com aquilo que expuseram o autor e o demandado nos seus escritos de demanda e contestação, o juiz redige a fórmula da concordância da dúvida (Cân. 1513), que explicita e define claramente o que se vai estudar e decidir. Nas causas de nulidade é declarado se consta, no caso, a nulidade do matrimônio em apreço, pelo(s) capítulo(s) de nulidade. Em continuação o juiz decreta a abertura da fase de instrução, a etapa probatória de recolhimento dos elementos demonstrativos que confirmarão ou não o sustentado no libelo.
Ouve-se primeiro o demandante, depois o demandado, em separado; a seguir, as testemunhas que tenham sido arroladas pelas partes. Em certas causas é requisitado o relatório e o laudo pericial e ainda examina-se, se houver, a prova documental, ou seja, os documentos públicos ou privados com os quais se intenta provar alguma coisa.
Com isto dá-se por terminado o período probatório e decreta-se a publicação dos autos do processo, para que o autor e o demandado e seus respectivos advogados possam conhecer e estudar todas as peças processuais. Os advogados apresentam então suas defesas, em favor ou contra, do que se pediu ao Tribunal. O defensor do vínculo faz seu relatório ao qual devem oferecer réplica os advogados, ficando-lhes assegurado o direito de tréplica, que tem sempre a última palavra na fase discussória.
Encerrando as alegações das partes, o Juiz decreta a conclusão da causa e convoca a sessão para decidir, reunindo o trio dos juizes que juntos apresentarão seus votos fundamentados e por maioria definirão a causa ditando a sentença em 1a instância.
Roteiro para exposição do caso
· O relatório tem a finalidade de oferecer dados concretos para averiguar se há base jurídica para a declaração de nulidade de matrimônio. Em caráter confidencial.
· Descreva com clareza, objetividade e riqueza detalhes os fatos e atos que envolveram a separação do casal.
· Os itens elencados têm a finalidade de orientá-la(a) na descrição, para que tenha seqüência e não esqueça dados importantes. Consequentemente, não devem ser transcritos nem numerados.

IDENTIFICAÇÃO DO CASAL

I. Parte Demandante:
01. Nome, filiação, localidade e data de nascimento.
02. Grau de instrução. Profissão.
03. Endereço residencial completo (atual) e endereço para correspondência (se for o caso). Telefone.
04. Qual a sua religião, a pratica? Onde foi batizado? Conhece algum sacerdote?
05. Data completa do matrimônio religioso e civil. Em que igreja? idade?
06. Como era sua família e seu relacionamento com ela?

II. Parte demandada

Informe sobre a parte demandada seguindo a ordem e os dados cfr. os itens 01 a 06 da parte Demandante.

EXPOSIÇÃO DO CASO

I. Preparação do matrimônio
01. Como, quando e onde conheceu a parte Demandada?
02. Como, quando e onde iniciou o namoro? Quanto tempo durou só o namoro? Como foi o tempo de namoro: havia brigas e desentendimentos? Por que? Houve intimidades? Gravidez? Chegou e desmanchar o namoro, quantas vezes e por quanto tempo? Quem procurava a reconciliação e por que?
03. Como, quando e onde iniciou o noivado? Quanto tempo durou o noivado? Como foi o tempo de noivado: havia brigas e desentendimentos? Por que? Houve intimidade, gravidez, chegou desmanchar o noivado? Quantas vezes e por quanto tempo? Quem procurava a reconciliação e por que? Se havia brigas na época do noivado, por que chegaram então ao casamento?

II. Matrimônio
01. Ambos foram livremente para o matrimônio, ou alguém ou alguma circunstância os obrigou ao matrimônio (quem? Qual circunstância?)
02. Como foi o dia do matrimônio, tudo correu normal na função religiosa e civil? E na festa que se seguiu? Notou alguma coisa no dia do casamento que levasse a duvidar do feliz êxito do mesmo?

III. Vida matrimonial
01. Houve lua de mel, onde e por quanto tempo? O matrimônio foi consumado? Houve dificuldades?
02. Quando surgiram os primeiros problemas do casal? Eles já existiam anteriormente ao casamento?
03. Relate pormenorizadamente os principais fatos (concretos) que prejudicaram o relacionamento do casal e levaram o casamento a um final indesejável.
04. Algum problema psíquico ou mental prejudicou o relacionamento? Esse problema era anterior ao casamento? (relate de forma clara e objetiva os fatos e atos praticados pela parte envolvida).
05. Houve infidelidade conjugal: de quem? Antes, durante ou depois do casamento? (relate fatos concretos)
06. Tiveram filhos? Quantos? Se não, por que? As partes assumiram as suas obrigações de casados com referência ao lar, ao outro cônjuge e aos filhos?
07. Amavam-se de verdade? Com que tipo de amor? Amavam-se com amor marital capaz de fundamentar o matrimônio? Quando descobriram que não havia mais amor entre ambos?
08. Quanto tempo durou a vida conjugal?

IV. Separação
01. De quem foi a iniciativa da separação e qual o verdadeiro motivo dessa separação?
02. Houve tentativa de reconciliação, de quem e qual o seu resultado?
03. Com quem vivem hoje as Partes?
04. Qual o motivo que o(a) levou a introduzir este processo no foro eclesiástico?

DOCUMENTOS ANEXOS
- Certidão do casamento religioso
- Certidão do casamento civil (com averbação da separação)
- Rol de testemunhas: 05 (cinco) pessoas que esteja a par dos fatos acima relatados, podendo ser familiares (nome e endereço atual completo).

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